Por Luiz Guilherme Dias | 08/12/2015.
Recentemente publicamos dois artigos motivados pelo maior desastre ambiental ocorrido na história do nosso país, causado pelo rompimento de uma barragem no distrito de Bento Rodrigues, município de Mariana (MG), intitulados: “Sustentabilidade: o que falta para assegurar?” e “Sustentabilidade: desejo versus realidade – Caso Samarco”. A amplitude da tragédia colocou a empresa Samarco e o Setor de Mineração no radar nacional e mundial, motivo pelo qual resolvemos postar este novo artigo procurando refletir se a destruição teve causa técnica ou ética.
No primeiro artigo discutimos o Índice de Sustentabilidade Empresarial (ISE), criado com o objetivo de ser uma ferramenta para análise comparativa da performance das empresas listadas na Bolsa de Valores sob o aspecto da sustentabilidade corporativa, além do desempenho empresarial nas dimensões econômico-financeira, social, ambiental e de mudanças climáticas. Nesta ocasião o ISE, possuía em sua carteira teórica 50 ações de 40 companhias, tendo a
Vale o maior peso (12%). Poucos dias após nossa publicação o site Plurale publicou um artigo intitulado “Vale está fora do Índice de Sustentabilidade Empresarial da BM&FBovespa de 2016”, repercutindo a nossa manifestação “assim como de outros analistas financeiros e especialistas em sustentabilidade que vinham cobrando um posicionamento firme da BM&Bovespa, uma vez que a Vale tinha o maior peso no Índice e teve a sua reputação e transparência em cheque diante da tragédia de Mariana”.
O segundo artigo focou a questão da ambiguidade entre os objetivos de longo prazo contidos na declaração de Visão da Samarco (dobrar de valor e ser a melhor do setor) contra as boas práticas de governança e crescimento sustentável. Analisando o Relatório Anual de Sustentabilidade 2014 tudo parecia estar “verde”, mas a realidade mostrou o “marrom” da lama que devastou a região, se arrastou por 600 km até o oceano Atlântico, deixando pelo caminho centenas de vítimas desabrigadas.
De acordo com informações da Wikipédia, “em sua história recente, a Samarco esteve envolvida em diversos episódios causadores de danos socioambientais nas áreas onde pratica a atividade da mineração. Reportam-se, por exemplo, ao menos cinco outros episódios de rompimento de estruturas, para além do notório caso em Bento Rodrigues, sendo que em quatro desses episódios houve vazamentos de lama que mataram peixes e paralisaram a captação de água. Além desses vazamentos, no ano de 2014 a Samarco juntamente com Arcellor Mital e Vale foi uma das responsáveis pela emissão de pó preto no ar causando poluição acentuada na cidade de Vitória (ES) e que resultou na CPI do Pó Preto”.
Por outro lado, em 2015 a Samarco transferiu ao município de Mariana cerca de R$37milhões relativos ao tributo da Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais, cuja alíquota é de 2% sobre o valor líquido da venda do minério, deixando 65% para o município e os restantes 35% divididos entre o estado de MG (23%) e a União (12%). Segundo matéria publicada pela Revista Exame (edição 1102 de 25/11/2015) “cerca de 30% da arrecadação do município de Mariana (R$6milhões/mês) vem da Samarco. A atividade de mineração é responsável por 80% da arrecadação do município, lembrando que a Vale também tem operação lá. Mais ainda: na crise recente provocada pela queda do preço do minério a Samarco demitiu apenas 23 dos 1.900 empregados da unidade de Mariana. Atualmente a empresa é percebida mais como de ajuda humanitária do que de mineração”.
Veja agora o que temos a revelar sobre a evolução das principais informações econômico-financeiras da Samarco de 2011 a 2014.
No período de 2011 a 2014 as contas de ativo e de patrimônio cresceram bastante com taxa anual composta (CAGR) de 28% e 24%, respectivamente. Os endividamentos oneroso e geral também cresceram a taxas em patamares elevados, de 28% e 30%, respectivamente. As receitas líquidas de vendas cresceram nos últimos quatro anos em nível muito abaixo da inflação (1,65%), promovendo um resultado operacional com CAGR de positivo 15%, mas EBITDA e resultado líquido com crescimento negativo, embora pequeno.
Observando os indicadores notamos uma margem líquida com grande média (39%), destaque para a rentabilidade patrimonial que alcançou um percentual excelente de 95% na média, níveis de endividamento oneroso e geral bastante elevados, liquidez de curto prazo abaixo do desejável e índice de crescimento sustentável elevado (91%, na média), lembrando que este indicador determina o nível máximo de crescimento que uma empresa pode sustentar sem a necessidade de garantir um financiamento adicional.
Comentários Finais:
Em 9/Nov/2015, quatro dias após a tragédia, o Governo do Estado de MG embargou as atividades da empresa por considerar a Samarco responsável pelo rompimento de duas barragens de rejeitos de mineração de ferro no município de Mariana, com a perda de muitas vidas humanas na comunidade de Bento Rodrigues e entorno, crise no abastecimento hídrico de cidades do vale do Rio Doce, e catástrofe ambiental nos corpos d'água afetados e nos maiores refúgios de mata atlântica do estado, atingindo também cidades do estado do Espírito Santo. (Fonte: Wikipedia).
A Samarco acertou com o Ministério Público de MG destinar R$1bilhão para reparos emergenciais causados pela tragédia. Além disso, o Ibama deve aplicar multa de R$250milhões para indenizações e limpeza do Rio Doce. No mundo desenvolvido, os valores envolvidos num desastre ambiental de grande porte, como o ocorrido em Mariana, podem variar de R$2bilhões (Agência de risco Fitch) a R$14bilhões (Comissão de Novas Regras para Mineração do Congresso Brasileiro).
Do ponto de vista técnico a Samarco poderia voltar a operar em 2016, desde que autorizada pelos órgãos públicos. Para a agência Fitch o processo poderá ser mais rápido se for provada uma causa técnica para o acidente, como por exemplo, se originada por um abalo sísmico. Para o Deutsch Bank, na melhor das hipóteses, a Samarco volta a funcionar em 2019. Já para os presidentes das controladoras Vale e BHP e da controlada Samarco, “a empresa só deverá voltar a operar se for esse o desejo da população”.
Outro aspecto que deve ser considerado é se as fiscalizações no setor de mineração estão sendo feitas com a qualidade necessária. Após o desastre, funcionários no DNPM (Departamento Nacional de Produção Mineral) formalizaram insatisfação com as condições de trabalho, dado que por amostragem mais de 400 técnicos monitoram 27.000 empreendimentos em todo o país; só no estado de MG são 4 funcionários para controlar 300 barragens. Há três anos encontra-se em tramitação no Congresso a aprovação de um novo marco regulatório com mais obrigações legais para as empresas do setor, que inclui a destinação de taxas setoriais para elevar o orçamento do DNPM para R$700milhões. (Fonte: Exame – 25/11/2015).
Em resumo, podemos afirmar que o acidente ambiental de Mariana deverá trazer um novo ciclo de aprendizado para a Samarco, como também para todo o Setor de Mineração que atualmente responde por 4% do PIB e emprega cerca de 200.000 pessoas no Brasil.
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Deixe o seu comentário ao final desta página sobre como você percebe a dualidade da causa da tragédia ambiental que esperamos continuar sendo a maior de todos os tempos em nosso país.
Luiz Guilherme Dias é Sócio-Diretor da SABE Consultores, Consultor de Empresas e Conselheiro Certificado.
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