“O que todo mundo quer é um bom trabalho. Essa é uma das descobertas mais importantes que o Gallup já fez”
Jim Clifton – Chairman e CEO do Gallup
Este artigo é o 3º da série sobre “Stakeholders” (clique aqui para ler o 2º da série). Nele damos continuidade ao resumo e adaptação de alguns capítulos do livro “Capitalismo Consciente – Como libertar o espírito heroico dos negócios”, editado pela HSM, que discute o papel e a importância das empresas conscientes, que atuam de maneira a criar valor não só para si mesmas, mas também para seus clientes, colaboradores, fornecedores, investidores, comunidade e meio ambiente ou usando o jargão do momento para seus “stakeholders”.
Para ilustrar de maneira objetiva a importância do Colaborador para o sucesso de uma empresa, mostramos a evolução da Distribuição de Valor Adicionado (DVA) para Pessoal (Colaboradores) com base nas informações de nosso Banco de Dados SABE.
Relembrando a teoria contábil, a Demonstração do Valor Adicionado (DVA) tem a função de identificar e divulgar o valor da riqueza gerada por uma entidade e como essa riqueza foi distribuída entre os diversos agentes que contribuíram, direta ou indiretamente, para a sua geração.
A DVA evidencia os aspectos econômico e social do valor adicionado. Sob a ótica econômica, expressa o desempenho da entidade na geração da riqueza e a sua eficiência na utilização dos fatores de produção, comparando os valores de saída com os valores de entrada. Sob o ponto de vista social, demonstra a forma de distribuição da riqueza gerada: a participação dos empregados (Colaboradores), do governo, dos agentes financiadores e dos acionistas, além da parcela retida pela empresa. Trata-se, desse modo, de uma importante fonte de informações, à medida que apresenta elementos que permitem a análise do desempenho econômico da empresa, evidenciando a geração de riqueza, bem como dos efeitos sociais oriundos da distribuição dessa riqueza.
A remuneração do trabalho (ou dos agentes Colaboradores), engloba os encargos com salários, comissões, honorários da diretoria, férias, 13º salário, FGTS, alimentação, transporte, participações nos lucros etc., apropriados ao custo do produto ou resultado do período. Não inclui encargos previdenciários ou com entidades do Sistema “S” (contribuições corporativas), que são considerados remuneração do Governo. (Fonte: https://www.editoraferreira.com.br).
Veja agora o que o nosso Banco de Dados SABE tem a mostrar sobre a DVA para “Colaboradores” de 243 Empresas (não financeiras) e de 25 Bancos de 2013 a 2015. O crescimento da DVA para “Colaboradores” das Empresas foi de 8,82% de 2013 para 2014 e de 9,68% de 2014 para 2015, praticamente nulo se considerarmos as inflações dos períodos. Por outro lado, o crescimento da DVA para “Colaboradores” dos Bancos foi de 3,66% e de 11,48% nos mesmos períodos. Esses números retratam o impacto da recessão econômica nesses duas grandes áreas da nossa economia.
Em 2015 os 10 maiores valores de DVA para “Colaboradores” de Empresas totalizaram R$94 bilhões (50 % do total) pelas seguintes companhias: Petrobras, Jbs, Vale, P.Acucar-CBD, Gerdau, Gerdau Met, Eletrobras, BRF SA, Ambev S/A e Telef Brasil. Também em 2015 os 10 maiores valores de DVA de “Colaboradores” para Bancos totalizaram R$41 bilhões (96% do total) pelas seguintes instituições: Banco do Brasil, Bradesco, Santander BR, Banrisul, Nord Brasil, BTGP Banco, BRB Banco, Amazônia, Merc Brasil e Banestes.
Os autores do livro mencionado na introdução deste artigo, John Mackey e Raj Sisodia, questionam se é possível construir um negócio com amor e confiança em vez de medo e estresse. Um fato deprimente sobre a realidade laboral moderna é que o índice de ataques cardíacos sobe de maneira drástica na 2ª feira pela manhã em todo o mundo. Lamentavelmente muitos odeiam o que fazem e ficam estressados com suas tarefas, além de conviverem em um ambiente de trabalho onde os colegas vêm uns aos outros como riviais ameaçadores. Serã que o trabalho precisa ser sinônimo de labuta?
No século 21, o anseio geral, especialmente entre as pessoas com melhor formação e renda, é trabalhar por mais do que o pagamento do fim do mês, trabalhar por algo que tenha significado, que faça a diferença para tornar o mundo um lugar melhor. O trabalho deve ser o lugar onde encontramos significado e propósito, mas também comunhão e prazer, um ambiente em que as pessoas conciliam produção com diversão.
Nosso trabalho pode existir em três níveis: emprego, carreira ou vocação:
- Emprego: o trabalho é um meio de sobrevivência, e a relação da pessoa com ele é uma pura transação comercial, uma relação de troca entre a quantidade de horas trabalhadas por salário e benefícios. Nesse contexto a vida fica restrita às noites, feriados e fins de semanas;
- Carreira: o trabalho é um meio de acesso a oportunidades de alcançar níveis mais elevados de responsabilidade e remuneração. Os profissionais carreiristas se concentram apenas no proveito próprio, prejudicando os colegas e a organização;
- Vocação: o trabalho não é meio e desperta a paixão para muito além do salário, para algo que o mundo realmente necessita. Por isso todos (empregadores e colaboradores) têm de lutar pelo maior número possível de pessoas envolvidas com seu trabalho, como se estivessem atendendo ao chamado de sua vocação.
Em muitas empresas a gestão de pessoas continua muito dependente de motivadores extrínsecos (“cenoura pendurada na vara de pescar”), como incentivos e ameaças. Esta abordagem só tem eficácia quando o trabalho não tem significado inerente nem potencial para a criatividade e satisfação, como numa linha de montagem por exemplo. Quando encontram significado e prazer no trabalho, as pessoas passam a se nutrir da mais poderosa motivação intrínseca. Para isso as empresas devem buscar contratar as “pessoas certas para os trabalhos certos”. Faz-se também necessário capacitar as pessoas para que tenham mais autonomia que junto com o propósito e a maestria permite que a empresa alcance altos níveis de motivação intrínseca.
Empresas conscientes têm muito cuidado ao contratar. O desafio é encontrar pessoas adequadas, que acreditem no propósito do negócio e que comunguem seus valores e cultura. Para encontrar a “pessoa certa” algumas empresas fazem oito entrevistas com oito pessoas diferentes. A prioridade é para o caráter e a integridade da pessoa, pois o resto pode ser ensinado. Em outras palavras, a ênfase é para o que o candidato “é” e não para o que ele “sabe”. Nesse contexto as pessoas tendem a ficar mais tempo na empresa que passa a poder investir na sua formação. A carga de treinamento formal oferecida a cada colaborador em empresas conscientes chega a 240 horas por ano.
Com respeito ao sistema de remuneração, empresas conscientes praticam a transparência total, ou seja, todos dentro da empresa têm como saber quanto os outros ganham. Dessa forma é possível que os membros da equipe identifiquem e denunciem eventuais falhas, dando à companhia a oportunidade de melhorar. Por outro lado a experiência mostra que quanto menores as diferenças na remuneração, menores são as chances de semear inveja e erodir confiança mútua entre os colaboradores, ou seja, violar valores essenciais.
Sobre a questão da equidade, empresas conscientes adotam uma política salarial que limita a remuneração total em dinheiro (inclusive bônus) de qualquer membro da equipe ao teto de 15 a 25 vezes o salário médio da empresa. Em companhias de capital aberto essa relação pode variar entre 400 e 500 vezes. O objetivo é equilibrar a equidade interna (o sistema de remuneração é percebido como justo) com a equidade externa (a remuneração para qualquer função específica é competitiva com o mercado).
Finalmente, sobre a questão dos benefícios, empresas conscientes rejeitam a discriminação de classes: todos, sem exceção, têm rigorosamente os mesmos benefícios que o Presidente. Com relação ao plano de saúde, utilizam dois programas que trabalham em conjunto: um plano médico-hospitalar de alta franquia (para cobrir emergências catastróficas) e uma conta pessoal de bem-estar (para cobrir necessidades mais corriqueiras, financiado pela empresa, como se fosse um seguro-reembolso de saúde).
COMENTÁRIOS FINAISAs informações obtidas dos DVAs das companhias do nosso Banco de Dados SABE retratam a difícil situação econômico-financeira que as companhias abertas brasileiras vem enfrentando nos últimos anos. Praticamente não houve distribuição de valor adicionado para Pessoas no período analisado de 2013 a 2015. Para enfrentar crises, é necessário ter a consciência que o propósito maior de uma empresa inclui a realização de lucros, mas acima de tudo a criação de valor para TODOS os públicos de interesse, principais ou secundários, cuja integração é chave para o sucesso do negócio.
Para os Colaboradores as empresas conscientes procuram criar ambientes de trabalho para desafiar e encorajar o aprendizado e o crescimento. Também compreendem a importância de manter equipes de trabalho autogeridas, autônomas, mas colaborativas entre si. Um negócio consciente se organiza em torno de motivações intrínsecas, como propósito e amor, e instaura um clima que permite aos Colaboradores florescerem como seres humanos aptos a conquistar a autorrealização. Como consequência os benefícios obtidos são compartilhados por todos os “stakeholders”.
A SABE Consultores tem o propósito de “organizar informações financeiras sobre as empresas brasileiras e torná-las acessíveis e úteis” e acredita que as empresas conscientes atuam de maneira a criar valor não só para si mesmas, mas também para seus clientes, colaboradores, fornecedores, investidores, comunidade e meio ambiente ou usando o jargão do momento para seus “stakeholders”. Manteremos você atualizado com novas informações extraídas do nosso Banco de Dados SABE.
Aproveite para deixar o seu comentário ao final desta página sobre este Artigo. Luiz Guilherme Dias é Sócio-Diretor da SABE Consultores, Consultor de Empresas e Conselheiro Certificado.