Por Luiz Guilherme Dias | 29/Dez/2015.
Segundo a Wikipédia, um tsunami (em japonês: ?? AFI: [t?s??nä?mi], literalmente "onda de porto"), por vezes também chamado maremoto é uma série de ondas de água causada pelo deslocamento de um grande volume de um corpo de água, como um oceano ou um grande lago. Devido aos imensos volumes de água e energia envolvidos, tsunamis podem devastar regiões costeiras. Esperamos que um fenômeno deste tipo jamais ocorra no Brasil.
Entretanto, para criar uma verdadeira cultura de educação financeira incluindo investimentos no mercado de ações no Brasil precisamos de um movimento em escala nacional com energia semelhante à de um tsunami, especialmente neste momento em que nossa economia está na UTI e, como consequência, nossa bolsa perde para a renda fixa e até mesmo para a minguada poupança.
A última edição da Revista RI de 2015 publica uma matéria sobre o tema da educação financeira que recentemente foi discutido em dois interessantes artigos publicados no Valor. O assunto merece reflexão pela grande importância que possui como também para a realização do sonho da “Pátria Educadora” em nosso país, motivo pelo qual resolvemos republicá-lo no apagar das luzes deste inesquecível ano.
Um dos artigos intitulado “Educação Financeira: reprovada” trata de uma profunda pesquisa realizada por três especialistas, colocando em xeque a tese que a educação financeira cria consumidores e investidores melhores. A conclusão indicou que “intervenções para promover a alfabetização financeira explicam somente 0,1% da mudança de comportamento, ou seja, o efeito da educação financeira sobre o comportamento é minúsculo, praticamente não tem resultado. E os efeitos são ainda mais fracos em populações de baixa renda”.
Um segundo artigo intitulado “Educação sob demanda” trata de um estudo a respeito da riqueza das famílias. A conclusão foi que “pessoas com maior conhecimento sobre finanças pessoais conseguem acumular mais patrimônio ao longo da vida porque planejam a aposentadoria de forma mais eficiente e desenvolvem melhor a capacidade para escolher investimentos mais rentáveis”.
Uma terceira via de reflexão poder ser a “Educação como criação de cultura”. Para dar foco a esta discussão será abordado o tema educação para investimentos em ações, pois inexiste no Brasil, compatível com seu tamanho e necessidade, uma comunidade de investidores informados e consequentemente um mercado de ações que reflita o tamanho da economia e das reclamadas necessidades de recursos e liquidez das empresas.
Apesar do crescente declínio do papel do mercado de ações no Brasil, pouco ou nada tem sido feito para restaurar sua verdadeira função e importância no processo de desenvolvimento do país. Países em desenvolvimento, como a China, Índia, Coréia do Sul e Tailândia, onde há algumas décadas praticamente não existia um mercado de capitais, hoje contam com esse poderoso instrumento de crescimento econômico.
A ausência de uma cultura de investimento em ações no Brasil se reflete no fato dos depósitos em caderneta de poupança e as aplicações em renda fixa serem as principais opções do mercado. Consequentemente a maior parte dos brasileiros está alijada do processo de crescimento das empresas e do desenvolvimento do país.
No Brasil, com uma população em torno de 200 milhões de habitantes, 27 milhões são declarantes de imposto de renda.
O número de investidores cadastrados na Bovespa representa apenas 2% do número de declarantes, ou 0,3% da população, enquanto que em mercados emergentes são 5% e em mais avançados este percentual chega a 10% da população. Do total do volume negociado na Bovespa, menos de 10% é originado em transações de investidores individuais; em 2009 este percentual era de mais de 30%.
A formação de culturas entre as pessoas é essencial desde o nascimento, num processo que evolui constantemente ao longo dos anos, começando nos próprios ambientes familiares e se desenvolvendo nas escolas, no trabalho e no convívio na sociedade, com respeito às regras e às leis. Recentemente vimos no Brasil a implantação de inúmeras “culturas” que antes não existiam: Proteção ao Consumidor, Proibição de Fumar em Locais Fechados, Lei Seca, entre tantas outras.
O processo de educação deve ser baseado em uma metodologia diferenciada de “aprender-fazendo”, objetivando atrair e orientar as pessoas comuns a conhecerem melhor o mercado de ações, através do incentivo à participação regular em “Clubes de Investimentos Educacionais” especialmente regulados e destinados a funcionarem como núcleos de treinamento e educação para a formação de poupança e investimento.
O Clube tem a finalidade de apoiar o desenvolvimento educacional sob a forma de um aprendizado coletivo e prático, como se fosse um “Comitê de Investimentos”, cujos membros são os participantes cotistas do Clube. Através da metodologia do “aprender-fazendo”, o participante é motivado a se organizar em Clubes de Investimentos Educacionais formados por grupos de 3 a 12 pessoas que se reúnem regularmente uma vez por mês (presencial ou online), sendo a 1ª parte da reunião dedicada à educação, orientação e informações sobre o mercado de ações e a 2ª parte dedicada à administração da carteira de investimentos. Esses Clubes de Investimentos Educacionais deverão ter um conjunto de características próprias com motivações específicas exclusivamente destinadas à criação do hábito de poupar regularmente. A gestão da carteira será exercida pelos próprios membros e a diversificação como prevista na Instrução CVM 494.
Para a formação dos recursos para investir na Carteira do Clube deverão ser feitos aportes regulares mensais. As cotas deverão ser preferencialmente iguais para todos os membros do Clube. O limite estabelecido para o patrimônio total do Clube é de 1.000 vezes o salário mínimo, que atualmente corresponde a R$788.000,00. A participação de cada pessoa, controlada pelo seu CPF, é limitada a apenas um “Clube de Investimento Educacional”. Entretanto cada pessoa pode, obviamente, participar de outros Clubes de Investimentos tradicionais ou investir diretamente de forma individual.
Para criar um Clube é necessário fazer o seu registro na Bolsa de Valores através de uma Corretora credenciada pela CVM (Comissão de Valores Mobiliários), seguindo as regras definidas por um Estatuto Padrão. A Corretora mantém a obrigação de informar mensalmente através de um extrato a posição da Carteira do Clube bem como a posição individual de cada membro cotista para fins de controle, acompanhamento e monitoramento dos investimentos realizados.
O elemento principal de diferenciação desta abordagem em relação a outras iniciativas é a proposta do “aprender-fazendo” como ferramenta de formação de uma nova Cultura. Segundo o Institute for Applied Behaviour Services, dentre todas as formas de aprendizado, o “aprender-fazendo” alcança uma taxa média de retenção de aprendizado de 75%. Outros processos como a leitura, os seminários e apresentações áudio-visuais são comparativamente ineficientes.
O “aprender-fazendo” em equipe nada mais é do que uma ferramenta de formação de cultura que evolui como um processo desde os ambientes familiares, nas escolas, no trabalho e nos ambientes sociais, com respeito às regras e às leis.
A formação de uma Cultura de Investimentos requer um processo de orientação e disciplina, que motive a reflexão e a crítica, que estimule a interação social, mas também a pesquisa autodidata. Seguindo esse processo os participantes atuam em seu próprio ritmo, flexibilizam seu horário e estudam e se informam no momento que for mais adequado. Ao mesmo tempo se comprometem com a periodicidade das reuniões de seu Clube e com a responsabilidade de contribuir para as decisões de investimento.
A educação financeira na linha da formação de uma cultura de investimento requer, portanto, um processo permanente de orientação e disciplina que, para ser deflagrado, necessita de uma energia como a de um tsunami, sem a qual não conseguiremos romper o tabu que a Bolsa foi criada apenas para a profissionais ou endinheirados.
Este artigo foi escrito em parceria com Roberto Teixeira da Costa (Economista, Fundador e 1º Presidente da CVM) e Ronaldo F. Nogueira (Economista participou do grupo de trabalho da Lei 4.728/65 que regulamentou o Mercado de Capitais no Brasil).
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Luiz Guilherme Dias é Sócio-Diretor da SABE Consultores, Consultor de Empresas e Conselheiro Certificado.
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